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sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Agora D. Pedro é morto...

Neste dia 18 de Janeiro fez 650 anos da morte do rei D. Pedro I de Portugal. Obviamente não é o NOSSO D. Pedro I, pois este foi D. Pedro IV de Portugal. Falo aqui do Príncipe D. Pedro de Borgonha, marido de D. Inês de Castro, personagem controversa da Idade Média, e literatura portuguesa, do qual saiu a frase "Agora Inês é morta". Aquela que o escritor Luís Vaz de Camões menciona como "a mísera e mesquinha, que depois de morta foi rainha".

Inês era descendente, assim como Pedro, do rei Sancho II de Castela. Ele por linha materna, e ela por linha paterna, além de detalhes de bastardia. O rei Sancho tinha uma esposa, chamada D. Maria de Molina, do qual Pedro descendia. E uma amante, chamada Maria Afonso Ucero, do qual descendia Inês. Esse pequeno detalhe, além de outras bastardias pelo caminho, deixou a família Castro tanto fora da sucessão de Castela, como de Portugal. Resumidamente, Pedro e Inês eram primos. Nos reinos ibéricos havia mais laços de parentesco do que as monarquias anglo-francesas da mesma época.

O rei de Portugal era um homem severo chamado Afonso IV, e arrumou um casamento para o filho Pedro, por questões políticas. Seria a princesa D. Constança, da linhagem real castelhana. Esta veio a Portugal acompanhada de um séquito de damas, entre as quais figurava D. Inês de Castro. Era bonita, chamou a atenção da corte lusitana, além de Pedro, é claro. E ocorre mais um fato curioso. Tanto D. Pedro, como D. Inês ou D. Constança eram descendentes do rei D. Fernando III de Castela. Estava tudo em família. Nada havia que fosse estranho a ninguém.

Com o tempo, passou a haver reuniões secretas entre Pedro e Inês. O rei ficou sabendo, e desportou Inês de volta à sua terra, em 1344. No ano seguinte, nasce o primeiro filho do Príncipe com D. Constança. Era Fernando, que seria o próximo rei de Portugal: D. Fernando I. Apenas ocorreu um imprevisto. D. Constança morreu no parto. No ano seguinte, Pedro traz Inês de volta do exílio. Esse ato iria desencadear efeitos sobre Portugal por séculos. Dali até 1353 nasceram todos os filhos de Pedro e Inês. Em 1354 Pedro se casa com Inês, com aval do Bispo de Coimbra. Não havia casamento religioso na época. Isso só surgiria cerca de 200 anos depois. Mas um Bispo poderia dar seu aval. Porém essa união de Pedro e Inês não foi reconhecida pelo papa Inocêncio VI, por sua carta "Nuper per certos", escrita a pedido do rei de Castela, já em 1361, após a morte de Inês.

Em 1355 ocorre o inesperado. O rei Afonso IV, apoiado por seus cavaleiros Álvaro Gonçalves, Pero Coelho e Diogo Lopes Pacheco, assassinaram Inês de Castro em Coimbra. Pedro estava ausente. Quando descobriu, se aliou aos irmãos de Inês, e à família Castro, e revoltou-se contra o pai. Ele e seu exército fizeram todos os roubos e saques que podiam em todo país. Afonso IV ficou boquiaberto. Nem as igrejas eram poupadas. Não tinham como ser pegos. Agiam como bandidos. Quando o país estava próximo de um colapso, a rainha mãe intervém para fazer a paz entre pai e filho. É feito um acordo de paz entre pai e filho. Ambos renunciam as suas vinganças. Isso ocorreu no burgo de Canaveses, em 1355, no mesmo ano da revolta.

Dois anos depois ocorrem duas coisas que mudariam o cenário do Reino de Portugal. Morre o rei Afonso IV, e Pedro assume como Pedro I. E nasce outro filho bastardo de Pedro, João. Este era filho de sua amante D. Teresa Lourenço, que fazia parte do séquito de damas de D. Inês de Castro, quando esta já estava casada com Pedro. Este João seria o futuro 'Mestre de Avis', que assumiria como D. João I o trono de Portugal, após a Revolução de Avis. Muitas coisas ainda iriam acontecer.

Com o trono assumido, Pedro quebra o acordo de Canaveses, e vai atrás dos assassinos de Inês. Diogo Lopes Pacheco consegue fugir, e obter exílio perante o rei de Castela. Mas os outros dois são capturados, e tem um castigo meio bárbaro. Eles têm seus corações arrancados. Um pelo peito, e o outro pelas costas. Após isso, Pedro pede ao papa a legitimidade do seu casamento com Inês de Castro. É negado, inclusive por causa da intervenção de Castela. É bom lembrar que os papas dessa epoca são franceses, e tem sua sede em Avinhon. E Castela era aliada da França na Guerra dos Cem Anos(1337-1453). Se tratava da segunda guerra dos cem anos. A primeira Guerra dos Cem Anos, entre França e Inglaterra, ocorreu entre 1152 e 1259, e terminou no Tratado de Paris(1259). Esta guerra anterior não tinha a coroa da França como objetivo, mas disputas em torno do ducado da Aquitânia.

Voltando a Pedro, o próprio Arcebispo de Braga, autoridade suprema do país, comparou Inês de Castro com Hagar, concubina de Abraão, na biblia. E seus filhos comparou a Ismael, filho de Hagar. Essa comparação também pesou nas decisões do papa. Resultado, em 1361 Pedro teve seu casamento negado. Não viveria muito depois disso. Sua morte ocorreu em 1367, e foi sepultado no mosteiro real de Alcobaça, em Coimbra, onde eram enterrados os monarcas portugueses. Seu túmulo tem 32 escudos de linhagem real. Porém o de Inês tem 44 escudos, entre os quais os da família Castro. Os corpos de ambos estão lá. E não estão lado a lado, mas frente a frente, pois Pedro disse que queria levantar de frente a ela na ressureição do juízo final.

Em 1383, morre o filho de D. Pedro I, o rei D. Fernando I. Este deixava somente uma filha, D. Beatriz, e casada com o rei de Castela. O Reino de Portugal seria incorporado. Os nobres aceitaram, mas os burgueses se uniram em torno de D. João, o Mestre de Avis. D. João, o Duque de Valência, e filho de Inês de Castro, também queria suceder, mas a carta papal, invalidando o casamento de sua mãe, o impedia. Então ele passou a apoiar o Mestre de Avis. Tudo foi decidido na Batalha de Aljubarrota(1385), no qual se destacou o condestavel Nuno Álvares Pereira. Eu vi uma vez a espada do condestavel, quando a exposição veio ao Brasil. Tem um tamanho colossal. D. João assume como D. João I, e Portugal entra numa era de glórias.

Após 650 anos da morte do rei D. Pedro I, ficam várias dúvidas. Foi a morte de D. Constança uma morte provocada, ou foi de parto como atestam os documentos? D. Teresa Lourenço foi amante enquanto D. Inês vivia, numa espécie de 'colheita'? Não sabemos. Em todo caso, os atos de Pedro mudariam para sempre a História de Portugal. Entre os descendentes de Inês de Castro estão figuras ilustres como D. Manuel I de Portugal e Maximiliano I, imperador habsburgo da Áustria. Os descendentes de Inês deixaram muitos rastros pela Europa. Sobre o túmulo de ambos, é sabido que há uma inscrição no de Pedro, dizendo que ambos estariam juntos "até o fim do mundo"...