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sábado, 8 de dezembro de 2018

A REVOLTA DE MANUEL CONGO

Nesses tempos de relembrar a consciência negra, é importante recordar o maior símbolo da resistência negra do estado do Rio de Janeiro, e o segundo do Brasil, só perdendo para o Zumbi dos Palmares. Era Manuel Congo. Um símbolo da revolta nos cafezais da região serrana da área de Vassouras, no atual municipio de Paty do Alferes. Durante a década de 1830, a economia cafeeira começou a despontar no Brasil Império, principalmente na região fluminense do Vale do rio Paraíba. A região de Vassouras ficou sendo a maior sede cafeicultora do mundo! A afluência de escravos para as fazendas da região aumentou, sendo ainda intensificada a exploração do trabalho.

No contexto de início da produção cafeeira, estourou mais uma revolta de escravos, que se consubstanciou na tentativa de formação do que ficou conhecido como Quilombo de Manoel Congo. Manoel Congo entrou para a história do Brasil como o líder que fez tremer os sólidos alicerces do regime escravocrata fluminense nas terras do café. Foi em Paty do Alferes que se desenrolou um dos mais importantes levantes de negros do Estado do Rio de Janeiro. Por volta da meia-noite do dia 5 de novembro de 1838, as portas das senzalas da Fazenda Freguesia eram arrombadas, e um grupo de negros cruzaram correndo o pátio em busca de suas mulheres que estavam no sobrado. Manoel Congo e Marianna Crioula iniciavam ali a saga que os levariam à História, e que para ele seria o caminho da morte. Os castigos e maus-tratos, além da morte de alguns escravos, pareciam ser uma constante nas fazendas do capitão-mor. O assassinato do escravo Camilo Sapateiro foi o estopim para a eclosão da revolta. Manoel Congo era um desses escravos. Seu nome provavelmente indicava a região do continente africano da qual era proveniente. A função de ferreiro exercida na fazenda do capitão-mor mostrava que tinha uma qualificação maior de trabalho, o que provavelmente garantia a ele condições menos piores de trabalho. Na mesma situação poderia estar Camilo Sapateiro.

Este grupo, liderado também por Pedro Dias, Vicente Moçambique, Antônio Magro e Justino Benguela, armado de facões e uma velha garrucha, invadiria, logo a seguir, a Fazenda da Maravilha libertando mais escravos e levando tudo que podiam carregar. Agora já somavam em torno de 400 escravos fugindo nas matas da Serra da Estrela, a caminho da Serra da Taquara, onde encontrariam a definitiva liberdade. O Capitão-Mor de Ordenanças, Manoel Francisco Xavier, proprietário das duas fazendas, e de todos os escravos fugitivos, ainda que contra sua vontade, porém diante dos graves fatos, pediu ajuda as autoridades competentes na figura do Juiz de Paz José Pinheiro. O Juiz imediatamente enviou mensagem ao Coronel-Chefe da Legião de Valença, Francisco Peixoto de Lacerda Werneck, que viria a acionar a Guarda Nacional. Apenas 48 horas após o último levante, Lacerda Werneck, já havia reunido 160 homens armados e prontos para a luta, entrariam na densa mata, dispostos a caçar os negros aquilombados. Vários escravos das fazendas da região fugiram para o local. Mas a experiência durou poucos dias. Em 11 de novembro, uma força militar da Guarda Nacional foi chamada à região para cumprir uma de suas funções, que era a de capitão do mato. O líder da Guarda Nacional era Luís Alves de Lima e Silva, o futuro duque de Caxias, que seria mais tarde patrono do exército, título conseguido muito em decorrência da repressão a diversas rebeliões populares que ocorreram durante o Império.

Partindo a Fazenda da Maravilha, com algumas léguas e horas de busca, primeiro ouviram sons de machado seguidos de burburinho de vozes. A tropa avançou angulada como uma cunha e exigindo a rendição de todos. Manoel Congo teve tempo apenas para incitar o ataque que iniciaria uma luta feroz, tendo como resultado na morte de muitos negros e dois soldados. A “preta de estimação” de D. Francisca Xavier, esposa do Capitão, Marianna Crioula, num gesto derradeiro, ainda gritou: “Morrer sim, entregar nunca!”, na exata hora em que era violentamente derrubada e espancanda com chutes, socos e coronhadas. Ali foram presos, Manoel Congo, Justino Benguela, Antônio Magro, Pedro Dias, Belarmino, Miguel Crioulo, Canuto Moçambique e Afonso Angola e as negras Marianna Crioula, Rita Crioula, Lourença Crioula, Joanna Mofumbe, Josefa Angola e Emília Conga.O homem que sonhou com a liberdade estava acorrentado aos seus pares e viria a ser réu no julgamento com sentença determinada muito antes de começar.

Desde a manhã de 22 de janeiro de 1839, na Praça da Concórdia, diante da Igreja Matriz da Vila de Vassouras, até o dia 31 do mesmo mês, o tribunal fora o palco da condenação dos réus, sendo a de Manoel Congo, pena de morte por enforcamento. Os demais escravos homens viriam a receber 650 chicotadas cada um além dos gonzos no pescoço durante 3 anos. Todas as negras foram inocentadas e o plano que fora articulado para minorar as perdas do Capitão dera resultado. Perderia ele um de seus negros, mas manteria os demais ao preço de incitar uma traição: todos indicaram Manoel Congo como líder do levante.

Passados 9 meses, no dia 4 de setembro de 1839, subia ao cadafalso, no Largo da Forca para cumprir sua “pena de morte para sempre”(isto é, enforcado e sem sepultamento), Manoel Congo, negro forte e habilidoso, de pouca fala e sorriso escasso, com mãos ásperas que sonhavam embalar um filho seu. Morreu levando com ele a esperança dos que ainda viram passar mais 49 anos até, finalmente, a liberdade chegar.

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