É uma história dramática. Tudo começou na Cultura Inglesa do bairro Jardim Guanabara, zona nobre da Ilha do Governador, em 1988. Nos conhecemos no curso de inglês, até porque estudávamos em escolas diferentes. Ele estudava no pior Colégio que já estudei na vida. E eu estudava em outra escola, que passei depois que saí da escola dele. Anos mais tarde descobri que ele me conhecia desde a quinta série. A alegação foi "uma criatura polêmica que nem você a gente não esquece". Mas eu não o conhecia. Só viria a conhecê-lo na Cultura Inglesa mesmo. Era a junção de um nerd em Física e teologia cristã(ele), com um nerd em Biologia evolucionista e Química Orgânica(eu). Mas não era só isso. Ele me levou para conhecer todas as principais religiões do mundo.
Aprendi sobre o mundo islâmico, igrejas ortodoxas e católicas em geral. Ele tinha medo do meu mundo darwinista. Dizia ser absurdo eu, como protestante, adotar algo sádico como Darwin. Ele, como católico, tinha medo desse mundo que era o meu. Mas o meu entendimento de Química Orgânica não me deixava analisar diferente. Cerca de 80% do que sei em matemática e teologia eu devo a ele. Mas desde o início a mãe dele não ia com a minha cara. Acusações de sodomia pairavam no ar. Imaginações retardadas também. Terminei o relacionamento com minha primeira namorada para ficar livre para passear com ele. Tudo bem, sem traumas. Ela era uma bosta como namorada mesmo. Era cabeça pequena, além de matuta.
A amizade seguiu seu curso, evoluindo. Decidi voltar às minhas raízes protestantes. Ele seguiu outro caminho. De quando em vez nos encontrávamos. Vim para a Baixada Fluminense. Perdemos o contato, até porque a mãe dele dificultava o máximo. Minhas tendências anabatistas, corrente que ele odiava por ser anti-ordem, o chocavam. Mas não foi tudo. Após o meu cadastro no site "Bolsa de Mulher"(hoje chamado Vix Mulher)achei o contato dele pela net. Mas daí tudo já tinha mudado. E na cabeça dele, para pior. Meu amigo era fã de Tomás de Aquino e eu virei combatente dessa teologia. Isso sem falar nas causas feministas, que para ele eram totalmente diabólicas. Há três anos notei que o Hangout dele estava bloqueado. O Gmail também. Resumidamente, perdi a melhor amizade que tive na vida, por causa da belicosidade dos temores religiosos atuais.
Essa história me lembra os choques mais remotos ocorridos na Ilha do Governador. Talvez por eu agora morar em Cabuçu, tudo mudou na minha vida. Cheguei aqui com 22 anos. Não tive infância ou adolescência nesse lugar. Se tivesse, minha cabeça tinha rolado há muito tempo.
Por isso que hoje eu até perco amizades cristãs, se for necessário, mas luto contra essa insanidade com unhas e dentes. Ele era um ano mais velho que eu, mas viu muito pouco do mundo. O mesmo povo da igreja que o assustava não conseguiu o mesmo efeito comigo. Eu fundei, junto com outros 11 jovens, o primeiro grupo jovem católico de atuação Internacional na Ilha do Governador: Os Apóstolos! E isso sendo protestante. Ele foi contra, pois disse que era perigoso. Mas mesmo assim fiz. Claro, tive que meter o pé assim que descobriram. Devem ter riscado meu nome da lista. Mas tudo bem, nunca me perguntaram nada antes disso. Eu sempre disse ser cristão e não estava mentindo. E eu agora sei que posso contar essa como uma das minhas façanhas. Que um protestante, na Igreja São José Operário, Ilha do Governador, fundou um grupo católico. Eu até entendo meu amigo. O meu tipo de entendimento era demais pra ele. Seja lá onde ele estiver, se estiver vivo, espero que esteja bem. Sempre soube que um dia nossas histórias seriam separadas.
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