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domingo, 30 de dezembro de 2018

LEOPOLDO GALTIERI - A MORTE DA GERENCIA MILITAR NA AMÉRICA LATINA

Capa da revista Veja de dezembro de 1981, relatando o golpe de Galtieri

Este ano de 2018 fez 15 anos da morte do general e ditador argentino Leopoldo Galtieri. Autor de um golpe militar, dentro de outro golpe militar, quando em dezembro de 1981 depôs o general Roberto Viola, que até então comandava a junta militar argentina. Naqueles tempos ocorria na Argentina o mesmo medo demente do comunismo que ocorria por aqui. E, como sempre, se tomavam decisões apressadas.

O General Leopoldo Fortunato Galtieri Castelli nasceu em Caseros, na região metropolitana de Buenos Aires, em 1926. Tinha ambições de se igualar a generais norte-americanos em batalha, como os heróis americanos da segunda guerra. Galtieri enfrentou várias resistências ao seu golpe. Pessoas marchavam pelas ruas pedindo sua renúncia. Ele não sabia como frear isso, afinal de contas um país precisa ter seu andamento normal para funcionar, porque militares não são tudo. Até que em 2 de abril de 1982 ele teve uma ideia insana: Invadir as ilhas Falklands, que seus compatriotas chamavam de ilhas Malvinas. Para isso tomou conselho com as piores entendedores possíveis em direito internacional. Nosso general Figueredo, pessoas de sua própria junta militar e até o tenente general norte-americano Vernon Walters, que disse que “os argentinos poderiam invadir, pois os ingleses iam bufar e bufar, mas não iriam reagir”, em suas próprias palavras para jornalistas brasileiros em um programa de TV da Rede Globo em Nova Iorque. Mas se enganaram. Margareth Thatcher era um osso duro de roer. Como Premier da Inglaterra, ordenou uma reação imediata. De princípio, parece que a Argentina mantinha bem as posses invadidas. Os EUA ficaram divididos, pois tinham seu parceiro da OTAN(e também do conselho de segurança da ONU), que era a Inglaterra. E tinham o seu 'quintal de atuação’, que era a América Latina, que agora tinham guerrilhas comunistas para combater. Por isso, de certo modo, o fato dos americanos terem ficado do lado da Inglaterra(após protestos da Thatcher), foi um duro golpe de confiança nos generais presidentes na América Latina para com o governo dos EUA.

A guerra das Malvinas teve momentos inusitados até para o Brasil, como a invasão do espaço aéreo brasileiro pelo Vulcan britânico armado com mísseis ar-ar Sidewinder. Foi forçado a pousar na base aérea do Galeão, no Rio de Janeiro, e desarmado. Este evento eu lembro, pois sobrevoou a minha cabeça. Eu tinha 9 anos e morava próximo a base aérea onde meu pai servia no quartel da FAB. Um outro evento foi a captura do capitão da marinha argentina Alfredo Astiz. Conhecido como “anjo loiro da morte”, foi responsável pela tortura de mulheres e crianças acusadas de comunismo. Quando este foi capturado, tremia que nem vara verde, mas o coronel britânico que o capturou dizia:”É este que torturava mulheres e crianças? O gerente da tortura de Galtieri?” A especialidade de Astiz era se disfarçar para infiltrar em organizações de direitos humanos, para depois vir capturar todos. Pois é, mas um dia é da caça. Outro do caçador. Pois enquanto países como França e Suécia reclamavam a sua deportação para ser julgado em seus países, tribunais internacionais reclamavam que ele precisava ser julgado por seus crimes na Argentina de acordo com os princípios de Direitos Humanos. O Reino Unido buscava cumprir o acordo de Genebra de direitos humanos em caso de guerra e entregá-lo para um julgamento justo. Se recusava a entregar o capitão, com receio que o torturassem. Nessa hora, um órgão que ele tanto atacou, agora era responsável por proteger a sua pele. Hoje o capitão cumpre prisão perpétua na Argentina.

Quando a guerra acabou, após a queda de Fort Stanley, Galtieri foi acusado pela população de morte inútil dos jovens na guerra. As pessoas saíam gritando pelas ruas:”Galtieri, borracho, mataste a los muchachos”(Galtieri, seu bêbado, mataste nossos jovens). O general seria deposto do poder em junho do mesmo ano. Mas esse não seria o único golpe que os militares argentinos levariam. Os tribunais internacionais exigiam o julgamento deles. E ameaçavam a Argentina com sanções econômicas, caso não aceitassem. O presidente Raul Alfonsín aceitou. Os generais Rafael Videla, Roberto Viola e Leopoldo Galtieri seriam julgados. O promotor Júlio Strassera, uma espécie de “Deltan Dallagnol” da Argentina dos anos 80, se empenhava ao máximo. A ditadura militar argentina começou com o pretexto de botar ordem na casa, mas abriu as portas para ladrões de galinha, como casos de 'roubos de geladeiras e camas’, mas com recibo. Coisas cômicas como essas foram descobertas.

Após a morte de Galtieri, muitas entrevistas foram concedidas à imprensa. A mulher de Galtieri disse, em uma entrevista em 2007, que os ingleses forçaram a Argentina a invadir as Malvinas. Segundo Carlos Galtieri, filho do ex-presidente, caso os argentinos tivessem aceitado a coabitação das ilhas, oferecida pelos ingleses, não teriam direito de reclamar soberania sobre as mesmas depois. Disse que o pai nunca quis ser presidente. Era um militar, não um político. Mas aceitou porque sentiu ser sua responsabilidade.

Mas o general errou. E errou feio. Armou seus aviões com mísseis Exocet. Também até com mísseis de gás napalm. Mas suas tropas não tinham classe militar para usar isso. A América Latina é feito de países com jeito tosco. São sardinhas que parecem caviar. A Guerra das Malvinas foi a consequência dessa estupidez. E Galtieri foi a bola da vez. Nos anos 90, o presidente Carlos Menem liberou Galtieri de uma prisão em regime fechado por este já ser septuagenário. Ficou em prisão domiciliar. Nunca pôde sair da Argentina. Morreria de câncer no pâncreas em 12 de janeiro de 2003. Com ele morria a idéia estúpida de armar qualquer país da América Latina para ser cabeça do mundo. Esqueceram que o desenvolvimento intelectual vem antes do militar. Se os EUA, que sempre foram ponta, quase perdem a liderança para URSS e China, porque sua ciência começou a valorizar credos criacionistas, quem dirá nós, que nem base estudantil sólida tivemos. Se cresce um país como se constrói um prédio: De baixo para cima. Esta é a lição que tiramos disso.

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